Voto Eletrônico, Voto Seguro?

sábado, setembro 30

"Urnas" eletrônicas: mitos e realidades

Por Antonio D'Agostino
Contabilista e Consultor de Empresas

Neste domingo, 1º de outubro, vamos votar. Para muitos, é o dia de escolher conscientemente seus representantes e exercer o direito de cidadania. Para outros muitos, infelizmente, será apenas o dia de cumprir uma obrigação, já que aqui no Brasil o voto é obrigatório. Entre todos, contudo, existe algo em comum, que a maioria esmagadora, multidão iludida, ignora: não há segurança alguma de que a nossa escolha cidadã será expressa no resultado divulgado no dia da eleição.

Naquele momento do voto, votem conscientes ou não, em branco ou nulo, todos acreditam estar fazendo o que é certo. Mas o resultado do voto não é garantido. Tudo por conta do mito “urna” eletrônica, grande mentira até no nome. Com efeito, o nome certo seria máquina de votar. Mas, sabe-se lá por qual motivo, de repente esta “urna” (propositalmente entre aspas) assumiu a identidade da verdadeira urna eleitoral, o local onde se depositam os votos, para depois serem conferidos. Na “urna”, não é possível conferir o voto.
Um fato, e notem que falamos de fatos e não de idéias, é que o sistema eleitoral brasileiro do qual tanto nos orgulha é o mais obscuro e inseguro do planeta. Não existe, absolutamente, nenhuma garantia de que os eleitos no próximo pleito sejam aqueles que escolhemos realmente... E pasmem: nem mesmo que o nosso sagrado e constitucional direito de sigilo do voto será mantido.
Nossa Constituição declara no artigo 14 que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e voto direto e secreto, com valor igual para todos”. Conforme está o nosso sistema de votação e apuração de votos, nada disso é garantido. Saibam o por quê a seguir.

As “urnas” eletrônicas não são brasileiras

Por que nos orgulharmos de algo que não nos pertence? As “urnas” eletrônicas são fabricadas pela Diebold, uma empresa americana (que, aliás, foi expulsa dos EUA). As peças são em sua maioria, importadas. Nem mesmo as essenciais, como os processadores, são fabricados aqui. Os sistemas operacionais que comandam a execução de todos os programas, ou são secretos ou são importados. Um deles é o Windows, o que nos leva a perguntar: o que tem de brasileiro nisto?

Milhares de programas das “urnas” são secretos...

A falta de transparência no processo de votação e apuração atinge proporções alarmantes. Apenas —literalmente— uma dúzia de pessoas conhece mais ou menos todos os programas de computador envolvidos. Pior: estima-se que por volta de 60 mil desses programas são secretos! Este fato nos remete a outra pergunta: por que 200 milhões de brasileiros são obrigados a acreditar na honestidade de uma dúzia de técnicos? E outra, quais as razões do legislador que admitiu a insana produção de programas secretos?

Seu voto não é secreto!
Lembre-se de que, quando você vota, o mesário primeiro digita o número de seu título de eleitor em um terminal, ligado diretamente à máquina de votar. No mesmo local, também é gravado o número do seu título de eleitor —e na mesma hora! Ora, qualquer programador iniciante será capaz de reconstituir quem votou em quem, mediante simples leitura do arquivo onde o voto e votante foram gravados! E com uma precisão jamais sonhada!

Com isso, é possível a criação de um gigantesco arquivo contendo todos os dados do eleitor, como nomes, endereços, estado civil etc. E a sua vontade expressa nas urnas. Imagine —só por um momento— este arquivo em mãos impróprias!

Impossível a recontagem de votos!
Suponha só por um instante que, no próximo domingo, aconteça de existir uma suspeita sobre o resultado da votação. Em qualquer país do mundo, ainda que a suspeita seja improvável, faz-se a recontagem dos votos.

No Brasil, isto é impossível!

Em 2003, a Lei 10.740 extinguiu a impressão em papel do comprovante do voto, que era depositado automaticamente em uma urna de lona (certo que, até então, não em todas). Tal lei, cuja edição é extremamente estranha, pois foi elaborada pelo Senado Federal e, em apenas duas horas, votada e sancionada na mesma noite, de madrugada, pelo presidente Lula, é combatida e desaprovada pela comunidade intelectual do Brasil, entre cientistas, juristas, professores universitários e outros.

A falta do comprovante impresso do voto, que deveria ser depositado na urna de lona, não só impede a transparência da contagem dos votos, como impossibilita a recontagem e a conferência do resultado.

Pior de tudo: nenhum partido político tem estrutura —e nunca vai ter— para fiscalizar todo o intrincado, misterioso e inacessível processo de votação atual.

O que existe de fiscalização é nada ou quase nada. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral), por sua vez, defende que o uso da “assinatura digital”, uma espécie de cadeado do programa de computador inserido nas “urnas”, garante a integridade dos programas por eles empacotados e distribuídos às zonas e seções eleitorais.

Primeiro, não existem pessoas suficientes para fazer a verificação urna a urna, em todo o país. E segundo, os próprios idealizadores da criptografia que compõe a assinatura digital não garantem sua inviolabilidade.

Informação biométrica: um perigo iminente
Sem que exista qualquer lei que admita coletar informações biométricas das pessoas, como a impressão digital, íris dos olhos etc., várias instituições vêm adotando este processo eletrônico. Um exemplo são os Detrans, para as carteiras de motorista.

O que ninguém observa é o perigo desta informação no meio eletrônico. Uma impressão digital, por exemplo, impressa no papel por meio de tinta de carimbo, é bem diferente daquela coletada por leitor ótico. Enquanto a primeira é original e dificilmente pode ser reproduzida, aquela que está registrada eletronicamente pode ser multiplicada indefinidamente. Isto significa, por hipótese, que seus documentos pessoais poderão ser reproduzidos e usados por outra pessoa.
Também o reverso é verdadeiro. A informação biométrica digitalizada de uma pessoa criminosa pode ser “adulterada” para uma pessoa de bem, e assim por diante, pois as possibilidades são infinitas. A mais grave delas é que se pode criar uma multidão infinita de eleitores clones bastando, para tanto, a reprodução do título original para várias pessoas, cada qual com sua “informação biométrica”!

E o que está pretendendo o TSE? Pretendendo não, fazendo. Já mandou encomendar e fabricar “urnas” eletrônicas com dispositivo de leitura de impressão de digitais para identificar biometricamente o eleitor.

Ora, não fomos consultados, como cidadãos, se queremos ou não fornecer nossas informações biométricas para o Estado, porque nada nos garante que esta informação não vá parar nas mãos de pessoas sem escrúpulos (que, no Brasil, são abundantes). Demais, atentem para o custo estimado da implantação deste sistema: R$ 1 bilhão de reais em dez anos!

Excesso de poderes do TSE
Depois de dura e longa luta, os brasileiros finalmente conseguiram a sonhada liberdade democrática, com a promulgação da Constituição de 1988. Os poderes atribuídos à Justiça Eleitoral, entretanto, foram herdados das ditaduras anteriores, desde a era Vargas até a dos militares.

O Tribunal Superior Eleitoral é a única instituição no Brasil que detém em si mesma, o exercício pleno dos três poderes. Fazem a legislação eleitoral, por meio de resoluções, e dão as interpretações que bem entendem às leis. Então são o Legislativo. São incumbidos de executar as eleições, daí, são o Executivo; e, finalmente, havendo problemas, julgam as demandas, exercendo a força do Judiciário.

Ficamos diante de um problema sério, bem claro nas palavras de Rui Barbosa: “Pode o Judiciário transformar-se na odiosa figura de juiz de si próprio”? Com efeito, se o TSE faz o regulamento, e é o responsável pela execução da eleição, seria ele o tribunal apropriado para julgar as fraudes e erros? Com que isenção vai admitir o próprio erro?

A fraude em Guarulhos
Causou grande espanto na imprensa, e naqueles que tomaram conhecimento, a fraude ocorrida nas eleições para prefeito e vereadores em Guarulhos, na Grande São Paulo, no ano de 2004. O espanto foi causado por um relatório de auditoria feito nas “urnas” eletrônicas, baseado em documentação fornecida pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo e pelo TSE. O relatório apurou fraude no resultado das eleições municipais.

Ali se encontraram urnas clonadas, totais adulterados, coincidências numéricas impossíveis e, até mesmo, montagem de tabelas falsas. O relatório demorou mais de um ano para ser terminado e devastou todas as informações eletrônicas das “urnas”. Foram analisados todos os documentos referentes à eleição, a fim de confirmar o resultado da mesma.

Mas a auditoria teria sido desnecessária se existisse o comprovante de papel na “urna”. Assim, qualquer leigo poderia recontar os votos manualmente, depois do resultado eletrônico. Como atualmente não existe essa possibilidade, foi preciso mais de um ano de trabalho para conferir se o resultado das eleições 2004 em Guarulhos estava correto. Um processo foi movido no TRE.
E fez o que a Justiça Eleitoral até agora? Apenas argumentou que o fato visa “desmoralizá-la”. Embora o Ministério Público tenha requisitado perícias e abertura de inquérito na Polícia Federal para investigar a fraude, o TRE apenas limitou-se a se defender, como se fora ele, tribunal, o autor —coisa que não está em lugar algum do processo movido, e nem no relatório.
Resta claro que o sistema de controle e apuração da votação, por todos conhecido como “urna” eletrônica, é ultrapassado e falho.

As instituições financeiras, os órgãos governamentais, as empresas em geral, além de tantos, gastam fortunas anualmente em auditoria e segurança de informática e, mesmo assim, não conseguem evitar roubos e fraudes.

Ora, os sistemas de votação já estão implantados há mais de 15 anos e continuam os mesmos. Porque seriam 100% seguros, conforme alardeiam as autoridades responsáveis —muitas das quais nem mesmo são afeitas à computadores?

As pesquisas não confirmam nada
Alguns néscios têm se levantado afirmando que os resultados das pesquisas validam a lisura do processo de votação, pois elas sempre confirmariam o resultado apurado. Dizemos néscios porque às vítimas que defendem seus algozes não encontramos termo mais apropriado.

Esta questão de a pesquisa validar o resultado, por sua proximidade com aquele, além de temerária (porque nem sempre isto acontece) é absolutamente incoerente. Se vamos pensar assim, então não precisamos nem de votação, é só fazer pesquisa. Depois, a pesquisa é outro tipo de processo que embora se diga alicerçado em base científica, também está sujeito a fraude.

A mais comum é aquela em que algum partido político ou mesmo candidato organizado, sabendo de antemão onde a pesquisa será feita, manda seus correligionários ficarem a postos para responder. Por mais idônea a empresa realizadora da pesquisa ou o órgão de imprensa que a divulgou, nada garante que expresse a vontade popular e nem mesmo que não esteja fraudada. Teríamos que admitir, também, que os entrevistadores foram absolutamente corretos e honestos ao apontar as respostas dos entrevistados nos formulários da pesquisa.

Perigos à Democracia
Estamos diante de problema muito sério, pois, pensemos bem: o controle eletrônico total de uma votação pode levar a um tipo de ditadura jamais vista na história, não só do Brasil como no mundo, a ditadura disfarçada em democracia.

Os eleitores pensariam que estão votando em alguém, no entanto, a “escolha” definitiva seria reservada a quem detivesse o poder de “apertar os botões”. Alguém, em sã consciência, pode afirmar que isto já não está acontecendo?

As possíveis soluções
Quando criticamos o sistema de votação eletrônica, não estamos de modo algum pregando a sua extinção. Se há alguma realidade nas mentiras do TSE é a que no Brasil conseguimos informatizar o processo de votação por inteiro. Afinal, o imenso número de eleitores nos dias atuais exige que tudo seja informatizado.

Queremos, porém, transparência e segurança, o que evidentemente não há no momento. Por outro lado, existem soluções das mais diversas apontadas por vários estudos e propostas que o TSE se recusa a sequer examinar, o que torna tudo ainda mais suspeito.

O voto impresso
Entre as propostas, está a geralmente aceita nos demais países: a de imprimir em papel o comprovante do voto. Este tipo de máquina de votar, nos EUA, por exemplo, é um dos sistemas mais avançados e seguros, que torna irrelevante toda esta parafernália de programas (inclusive os secretos).

Um dispositivo de impressão acoplado à máquina de votar, mostra ao eleitor o papel com o voto impresso dentro de um visor plástico, que, depois de confirmado, é cortado e lançado dentro de uma urna de lona. Havendo dúvidas quanto à lisura do pleito, basta abrir a urna de lona e contar os papéis impressos. Em alguns casos, a recontagem é obrigatória quando a diferença entre os votos entre um candidato e outro é pequena.

Este é o meio mais transparente e seguro proposto até o momento, porque a impressão em papel torna a conferência acessível a todos, e não somente àqueles especializados em informática. Também permite que forças antagônicas (partidos e candidatos opostos) possam controlar e conferir os resultados.

A identificação do eleitor separada da máquina de votar
Outra questão da maior relevância é o sigilo do voto. Uma das maneiras de garantir o sigilo é a de modificar o atual sistema, eliminando a comunicação entre o terminal de identificação do eleitor e a máquina de votar (“urna” eletrônica). O modo de identificar as diversas seções de votação também teria de ser modificado, de modo a não permitir a criação de grandes arquivos com resultados conjuntos de votos e votantes.

Um título de eleitor mais apropriado
O documento de identificação do eleitor também precisa ser modificado, pois os atuais nem foto têm. Por outro lado, não existe a menor necessidade de informação biométrica para conferir se é este ou aquele o portador do documento. Este tipo de identificação, além de perigoso, é inócuo, pois pode ser reproduzido.

Não há um documento ideal. Portanto, a melhor maneira é assegurar que os eleitores possam facilmente alterar seus endereços, transferindo os títulos, de modo a evitar acesso de pessoas de comunidades diferentes na mesma seção de votação (ex: pessoas para votar e apresentar justificativa). Um bom código de barras agilizaria o processo de identificação e reduziria a fraude. A identificação por fotografia atualizada e datada também é essencial.

Conclusão
Nosso direito de cidadão e de eleitor não está sendo respeitado. Não fomos consultados sobre coisa alguma deste sistema e ele nos foi imposto de cima para baixo, o que em si já é contra a democracia.

A Constituição não está sendo cumprida. Se o voto tem que ser secreto, porque não o é de fato? Se o voto deve ter igual valor para todos, porque somente uma dúzia de pessoas entende o que está acontecendo com o nosso voto?

Afinal, em um país como o Brasil, de dimensões continentais, várias culturas e, principalmente, analfabetismo, como pode um processo eletrônico complicadíssimo igualar o poder do voto? Multidões comparecem às urnas sem mesmo saber o que estão fazendo. Esta é a realidade, e não o mito a nós imposto.

É preciso entregar aos seus verdadeiros donos os poderes concentrados do TSE, com o fim de implantar novos sistemas que assegurem esta igualdade e sigilo. Do contrário, seremos amanhã os protagonistas de “uma sociedade insana que ergueu contra si um tão poderoso Leviatã”!

terça-feira, setembro 26

Entrevista: especialista questiona segurança do voto eletrônico


Por Redação do IDG Now!

São Paulo - Engenheiro do PDT e autor de livro sobre fraudes nas eleições eletrônicas, Amilcar Brunazo, critica processo de segurança praticado pelo TSE. A segurança do processo eleitoral eletrônico é tema de estudos do engenheiro Amilcar Brunazo, desde 1996, quando foi contratado pelo PDT como técnico especializado na avaliação da urna eletrônica brasileira.

Em entrevista ao IDG Now!, Amilcar, que também é autor do livro "Fraudes e Defesas no Voto Eletrônico" e possui um site sobre o voto seguro afirma que a possibilidade de fraudes nas eleições eletrônicas vai além da urna e critica o processo de auditoria de segurança do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A impressão do voto eletrônico pode eliminar possibilidades de fraudes levantadas no processo eleitoral?
O processo eleitoral eletrônico tem várias etapas: começa no cadastro eleitoral, passa para a votação, depois para a apuração e depois para a totalização. Qualquer uma dessas etapas pode ser atacada. Então, o problema vai além da urna eletrônica. Por exemplo, o ex-presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Carlos Velloso, declarou recentemente que o cadastro eleitoral tem eleitores fantasmas. São títulos eleitorais que estão nas mãos de alguém e qualquer pessoa pode usar esses títulos para votar mais de uma vez.
Com a biometria, que será usada nas urnas eletrônicas, isso seria eliminado?
As 25 mil urnas com dispositivos de biometria compradas este ano ainda não serão usadas nestas eleições, porque é preciso fazer um cadastro das impressões digitais anteriormente. Mas a tecnologia não resolve totalmente este problema porque um título eleitoral fantasma permite a criação de, por exemplo, dez títulos para uma mesma pessoa. Um jeito muito mais fácil e barato de eliminar o problema, que já foi usado no Brasil em eleições em papel e é aplicado em outros países para evitar os eleitores fantasmas, é pintar o dedo do usuário com uma tinta especial. Essa tinta ficaria na pele por mais de 24 horas impedindo que a pessoa votasse novamente. Não é alta tecnologia, mas funciona.
O processo de Sala de Apresentação de auditoria das urnas eletrônicas é suficiente para garantir a segurança do processo de voto eletrônico?
É absolutamente inútil, não é só insuficiente. No processo realizado de abril a setembro deste ano, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e o Ministério Público Federal não compareceram. Dos partidos compareceram três [PDT, PT e PV] e o processo [de Sala de Apresentação] não permite que seja acompanhado o desenvolvimento porque não são apresentados todos os sistemas.

Quais sistemas são apresentados?
Este ano fiz petições em junho, julho e agosto pedindo para o TSE mostrar os sistemas operacionais que são colocados nas urnas. Hoje existem três sistemas - VirtuOS, Windows CE 4.0 e Windows CE 4.2. Solicitei que estes três sistemas fossem apresentados para análise em junho e só apresentaram o Windows CE 4.2 uma semana antes do encerramento da apresentação em setembro. Outra dificuldade é que, na Sala de Apresentação, as dúvidas dos técnicos não são solucionadas na hora. É preciso enviar uma petição com a dúvida e, às vezes, isso leva meses para ser respondido.
Em que momento o processo eleitoral eletrônico pode sofre maior risco?
Existem duas maneiras de atacá-lo. Uma delas envolveria o pessoal encarregado da transmissão de informações. Outra se daria no momento em que são transmitidos em flash cards os programas dos cartórios para as urnas eletrônicas [processo de 'inseminação da urna']. Neste momento, o flash card que contém as informações é muito vulnerável por serem fáceis de duplicar, adulterar e não serem lacrados.

Mas quem fica responsável pelo manuseio destes flash cards não são funcionários do TSE?
Nem sempre são funcionários do TSE. Como aumenta muito a carga de trabalho na preparação das urnas, neste período, eles contratam 13 mil funcionários terceirizados que trabalham de agosto a outubro. São funcionários que recebem em torno de 400 reais por mês e podem estar muito vulneráveis à corrupção. Isso é muito perigoso.
Qual seria o modelo ideal de segurança para o voto eletrônico?
Lembrando que o problema é maior do que a urna eletrônica, neste ponto do processo, o ideal é a urna eletrônica real, que é aquela que emite um comprovante materializado do voto, que o eleitor possa conferir e que depois seja usada para fazer uma conferência da apuração eletrônica. A rapidez do processo continua, mas haveria a possibilidade de conferir o voto. Esse tipo de urna foi usada nas duas últimas eleições na Venezuela e é a urna que está se tornando obrigatória nos Estados Unidos, em mais da metade dos Estados.
Existe algum processo eleitoral 100% seguro?
O processo eleitoral depende sempre de pessoas. Costumo dizer que é necessária a participação de três tipos de pessoas para que ocorram fraudes: candidatos corruptos, que queiram atacar o sistema; funcionários corruptos, que aceitem serem comprados para facilitar ou bloquear acessos ao sistema; e fiscais despreparados, que não percebam as fraudes que estejam ocorrendo. A única chance de os partidos diminuirem isso é termos condições de fiscalização mais adequadas, preparando fiscais.
É possível que o eleitor vote em um candidato e que a urna registre outro? Como isso ocorre?

Tecnicamente é possível. Para fazer isso é necessário adulterar o programa original que está na urna. Isso pode ser feito em dois locais: dentro da Justiça Eleitoral ou no momento em que as urnas são carregadas nos cartórios eleitorais. De acordo com um recente teste feito pela Universidade de Princenton, nos Estados Unidos, é possível adulterar o software com um códido malicioso e ainda contaminar urna por urna cada vez que ela for carregada.

Qual a importância da realização de testes de segurança das urnas como foi feito pela Universidade Princenton em setembro deste ano?

Estes testes devem ser feitos por pessoas capacitadas a atacar os sistemas de urnas eletrônicas. É mais do que sabido que em o nosso complexo sistema eleitoral - com mais de 50 mil arquivos - é natural que sobrem falhas de segurança que o projetista não consegue identificar. Os ataques de penetração têm esse objetivo. No teste feito em Princenton foi usada uma urna e-virtual - mesma categoria das urnas brasileiras - mas um pouco mais moderna do que a nossa, por ser um modelo com teclado touch screen. Os sistemas de segurança e qualidade são equivalentes.
Este foi o primeiro teste de penetração de urnas eletrônicas?

Não. Já houve um teste de penetração não-oficial realizado no Paraguai com urnas eletrônicas brasileiras usadas nas eleições de fevereiro de 2006 mostrarando que era possível adulterar o software. Em maio, foi realizado o "Relatório Hursti" também com urnas da Diebold, nos Estados Unidos, por uma empresa especializada chamada Black Box Voting. Isso tudo mostra a importância destes testes. Aqui no Brasil os projetistas insistem que o sistema é seguro, mas não permitem que este tipo de teste seja feito. Este ano, foi feito um novo pedido conjunto pelo PT e o PDT de realização de um teste de penetração, no início de junho, e até agora o processo está parado no TSE. A idéia é que a Justiça Eleitoral tenha tempo de corrigir os testes antes das eleições.
O TSE informou ter investido 200 milhões de reais na segurança do processo eleitoral eletrônico. De quanto seria o investimento ideal?
Os 200 milhões de reais que eles dizem que aplicaram foram dedicados exclusivamente em defesa da Justiça Eleitoral contra invasões externas, para proteger os códigos, desenvolver criptografias etc.
Esse é um modelo de segurança equivocado porque quem tem de ser protegido no processo eleitoral é o eleitor em primeiro lugar. Os outros agentes, que são os partidos, os fiscais e a própria Justiça Eleitoral também têm de ter suas cotas de proteção, mas a Justiça Eleitoral gasta milhões de reais e não permite a realização dos testes nas urnas, que garantem a transparência ao processo, por exemplo. Nesse instante o interesse dela não coincide com o interesse do eleitor.
Um exemplo marcante é o da OAB. Ela tem direito de fiscalizar os programas e em 2004 tentou fazer isso, mas chegou à conclusão que não era possível. Este ano, [a entidade] ficou de fora do processo por não ter dinheiro para verificar a carga de 400 mil urnas. A Justiça Federal não ajuda outras entidades a fazerem a fiscalização externa, que faz parte do processo de segurança das eleições como um todo.
Do jeito que estão aplicados, digo que os 200 milhões de reais não são suficientes porque está faltando investir na segurança fora [do ambiente] da Justiça Eleitoral. Ela gasta esse valor é dedicado à proteção dela, mas se alguém lá de dentro resolver fraudar o sistema não será alcançado pelos fiscais [dos partidos].
Para fazer a verificação da assinatura digital, por exemplo, é preciso de equipamentos e treinamento. Tudo isso poderia ser feito. Em relação aos programas de computador da urna, por exemplo, o TSE insiste que são mostrados, mas nem os partidos nem a OAB têm condições de passar seis meses analisando esses programas. O TSE poderia pagar os custos de uma auditoria externa independente.
Existe a possibilidade de termos eleições com urnas com impressão dos votos futuramente?
Acho que em longo prazo sim, mas aqui no Brasil como o processo errado foi iniciado, acho que vamos acabar ficando na rabeira do mundo.
O eleitor brasileiro está muito satisfeito com a eleição eletrônica. O resultado da eleição sai em seis horas, o brasileiro fica feliz da vida achando que tem o sistema mais moderno do mundo, mas este não é o mais moderno, é o mais rápido.
Acho que a rapidez é uma característica desejável. É bom que a apuração do sistema eleitoral seja rápida, mas a confiabilidade é uma característica necessária. Talvez somente se acontecer alguma fraude que apareça para o público, ocorram mudanças.

segunda-feira, setembro 25

Dez anos depois, urna ainda é vulnerável, dizem especialistas

A urna eletrônica brasileira é “fraudável”, avaliam técnicos; sistema eleitoral é “100% seguro”, contesta TSE

Por Mariana Oliveira, do G1, em São Paulo

Os 125 milhões de eleitores brasileiros terão novamente à disposição em 1º de outubro o mais moderno equipamento de votação do mundo. Mas, passados dez anos da implantação do sistema, ainda não podem ter absoluta certeza de que o resultado da eleição reflete a vontade dos eleitores.Consultados pelo G1, três especialistas que conhecem o sistema por dentro avaliam que as urnas são vulneráveis. São eles o engenheiro Amílcar Brunazo Filho --um dos principais especialistas em segurança de dados do Brasil--, o professor de Ciência da Computação da Unicamp Jorge Stolfi e o ex-juiz eleitoral Ilton Carlos Dellandréa. Os três são unânimes: a urna eletrônica é “fraudável”.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contesta. “O sistema é 100% confiável”, afirma o secretário de Tecnologia da Informação do tribunal, Giuseppe Dutra Janino.

Leia também neste especial preparado pelo G1:

- Infográfico: entenda como funciona a urna eletrônica
- Risco está na corrupção, diz engenheiro
- Urna é 100% confiável, diz TSE
- TSE promete identificação por biometria em 2008

Para Brunazo, Stolfi e Dellandréa, o principal problema da urna eletrônica é que ela não imprime um comprovante a ser conferido pelo eleitor. Não é possível saber se o voto foi computado corretamente. Atualmente, o eleitor digita o número do candidato, vê a foto dele e confirma a opção. Porém, segundo os especialistas, o sistema pode ser alterado para não funcionar exatamente assim. Por exemplo, alguém envolvido na criação ou instalação do software das urnas poderia reprogramar o sistema para mostrar a imagem de determinado candidato e computar o voto para outro. Na hora da contagem dos votos, a fraude não seria detectada.

Nova urna
Os três especialistas defendem um novo modelo de urna eletrônica, que imprimiria o voto para ser conferido. O eleitor veria o voto impresso através de uma janela de vidro, mas não teria acesso ao comprovante, que ficaria depositado em uma urna lacrada. Em caso de dúvida sobre o resultado, essa urna seria aberta para uma recontagem manual. Nesse novo sistema, a apuração continuaria rápida, mas, se fosse contestada, o resultado poderia ser comprovado na recontagem.
O TSE rejeita essa proposta. O argumento é que o sistema de impressão poderia facilitar que pessoas interessadas em tumultuar a eleição afirmassem que a urna não computou o voto corretamente. O tribunal avalia que, com a implantação da assinatura digital --que trava o sistema no caso de qualquer modificação-- e com a possibilidade de os partidos políticos terem seis meses para conferência do sistema, as fraudes não ocorrem.
O professor do Instituto de Computação da Unicamp Jorge Stolfi -- que ressalta falar por si e não pela universidade --, diz que o fato de o TSE abrir o sistema para inspeção dos técnicos dos partidos políticos não resolve e questão.
“Eles abrem apenas o software da votação e não o software da urna, que é como um Windows num computador comum. Além disso, o software das urnas tem 1 milhão de linhas de código, o que representa que em seis meses temos de verificar 5,5 mil linhas por dia. Para fazer uma verificação eficaz no sistema, conseguiríamos checar apenas 50 linhas de código diariamente.”
O engenheiro especializado em segurança de dados eletrônicos, Amílcar Brunazo Filho, lançou em agosto o livro “Fraudes & Defesas no Voto Eletrônico – A Urna Eletrônica em Xeque”. Ele vai ainda mais longe na contestação do sistema eleitoral brasileiro. Acredita que, não somente as urnas, mas todo o processo pode ser fraudado, desde a emissão dos títulos de eleitor até a totalização dos votos.“
As etapas de cadastramento eleitoral, votação, apuração e totalização podem ser atacadas por pessoas inescrupulosas que obtenham acesso ao sistema em alguma dessas etapas”, afirma Brunazo Filho.
Teste
Em julho deste ano, Brunazo Filho protocolou no TSE um pedido para demonstrar ao tribunal, por meio de um teste, que as urnas são vulneráveis a fraude. Ainda não obteve resposta. O secretário de Tecnologia da Informação do TSE, Giuseppe Dutra Janino, disse ao G1 que o órgão estuda a melhor forma para fazer o teste de maneira científica. “
Não temos condição de preparar isso no meio de um processo eleitoral. É nosso interesse mostrar a transparência do processo”. Segundo Janino, o teste poderá ocorrer no primeiro semestre de 2007.
Para o ex-juiz eleitoral Ilton Carlos Dellandréa, aposentado em 2002 e que atuava como presidente de zona eleitoral em Porto Alegre quando o equipamento eletrônico começou a ser utilizado, em 1996, “a urna eletrônica virtual que será usada nas próximas eleições não é segura como deveria ser e, por isso, não é confiável”.
O ex-juiz afirma que nunca recebeu informações detalhadas sobre o processo e só percebeu que a urna é fraudável quando, já aposentado, resolveu se informar melhor sobre tecnologia da informação. “
A urna é um aparato de informática, e todo mundo sabe que qualquer aparelho programável por seres humanos apenas obedece a comandos. Pode ocorrer a inserção de comandos mal-intencionados por programadores também mal-intencionados.”
Segundo o TSE, o Brasil é o único país do mundo em que o sistema eleitoral é 100% eletrônico, e serve de exemplo para outros países. O engenheiro Amilcar Brunazo Filho, no entanto, diz que nenhum outro país, com exceção do Paraguai , adota o sistema 100% eletrônico, justamente por causa da possibilidade de fraudes.
O TSE confirmou que o Paraguai foi o único a adotar, mas disse que em outros países as urnas eletrônicas estão em fase de testes.

terça-feira, setembro 19

Urnas Eletrônicas - confiáveis ou não?

Por Davi Castiel Menda, matemático de Gravataí (RS)

“O que importa não é quem vence, e sim quem conta os votos” – Joseph Stalin

Antes que você, prezado eleitor brasileiro, tente me desqualificar, gostaria de lhe lembrar de que, em 1982, quando você talvez nem conhecesse o vocábulo computador (ou quiçá tivesse nascido), eu já tivera três deles e, indignado por outros brasileiros não poderem desfrutar daquele aparelhinho que prometia ser um dos maiores avanços tecnológicos da humanidade, eu, com dois outros amigos, instalamos uma fábrica de computadores. Veja bem, Fábrica, e não uma montadorazinha de fundo de quintal. E um computador que deu o que falar na época. Portanto eleitor brasileiro – de computadores, eu entendo!

Antes que você, prezado eleitor brasileiro, tente me desqualificar, gostaria que acessasse o Google, digitando meu nome completo, e você vai verificar que meus conhecimentos matemáticos e estatísticos são reconhecidos nacionalmente. Portanto eleitor brasileiro – de matemática, eu entendo!

Antes que você, prezado eleitor brasileiro, tente me desqualificar, gostaria que lesse trechos de dois artigos abaixo, publicados em Zero Hora:

14.11.85 – Apuração paralela – Enquanto os computadores do TRE estiverem trabalhando no resultado das eleições, a 111a. Junta Eleitoral já terá o resultado das 270 mesas que a constituem. Isto porque a Junta contará com a ajuda de um computador e de uma programação feita por empresa especializada.

A bem da verdade, gostaria de lhe informar que a empresa especializada era de minha propriedade e a programação pessoalmente desenvolvida por mim (a cessão do micro e do software foi totalmente graciosa).

19.11.86 – Microcomputador é o sucesso da 111a. Zona – Uma economia de tempo de 40 minutos em cada urna apurada é o resultado da experiência que deu certo já no segundo ano consecutivo, na junta apuradora da 111a. Zona: a utilização de um microcomputador, cortesia do secretário da Junta, Davi Castiel Menda. ..... No entanto, Davi Castiel, a convite do presidente da Junta Apuradora, Juiz Jorge Perrone, sofisticou o serviço da Secretaria, através do computador. Etc. etc. etc.
Portanto prezado eleitor brasileiro – de apuração de eleições, eu entendo!

Mas o assunto é “Urnas Eletrônicas”. Afinal, pode-se confiar nelas ou não? Comece lendo um trecho de artigo publicado por Ipojuca Pontes em 29.08.2006:

“Por sua vez, o leitor Rodolfo Hazelman, advogado em São Paulo, capital, ficou estupefato quando viu numa reportagem do Jornal da Band, um empresário de Guarulhos comprovar, a partir de dados fornecidos pelo próprio TRE, a ocorrência de fraudes nas urnas eletrônicas, na última eleição municipal daquela cidade. Ele acha o fato da maior gravidade, visto que, no Brasil, as urnas eletrônicas são vendidas como à prova de fraude - quando, de fato, não são”!

Já o leitor de nome Márcio, mais audacioso, identifica a irregularidade dos números das pesquisas em favor do candidato-presidente como uma espécie de preparação psicossocial para contestar o futuro resultado das urnas eletrônicas fraudadas. Para dar credibilidade a sua argumentação, Márcio informa, depois de transcrever substanciosa aula sobre urna eletrônica, que a única possibilidade de se garantir a integridade das urnas é o acoplamento de uma impressora dentro do aparelho, que por sinal já existe, mas que, "por proibição de Nelson Jobim (ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral), não deverá ser usada para imprimir os votos" comprobatórios.

Na aula técnica transcrita, feita pelo especialista Carlos Tebecherani, é assinalado que se o programa (software) da contabilidade dos votos for alterado para que desvie somente 1 voto em branco (ou nulo) por urna, para um determinado candidato ou legenda partidária, só em São Paulo, por exemplo, cerca de 85 mil votos poderiam ser "remanejados". Sobre a "inauditabilidade" das urnas eletrônicas, uma eterna preocupação do falecido engenheiro Leonel de Moura Brizola, o especialista Tebecherani - apoiado em análises de professores e cientistas dos mais diversos centros de ensinos nacionais e internacionais - considera que os seus programas "são facilmente passíveis de alteração", sendo a própria "urna passível de ataque externo sem que o lacre que a encerra seja rompido".
Continuando este despretensioso artigo, cito trechos do escritor, editor, pensador e intelectual José Stelle (que na sua modéstia se auto-intitula tão somente aspirante a political philosopher) em e-mails a mim dirigidos, e antecipadamente peço-lhe perdão por dar ciência aos que os lêem, sem saber da sua concordância ou não em editá-los. Se eu não os divulgasse, estaria pensando e agindo egoisticamente no meu bem próprio, sem considerar aos interesses alheios.

“Mas devemos levar em conta que a fraude eleitoral pode causar distúrbios. O PT não vai simplesmente aceitar ser alijado do poder. Eles pensam ter a deusa HISTÓRIA do seu lado, o que justificaria tudo. E como disse Stalin: “O que importa não é quem vence, e sim quem conta os votos”.

Esta última frase é genial, e não sei se o mérito deva ser dado ao autor, Stalin, ou ao Stelle (afinal, são quase homônimos) que a garimpou! Mas prossegue Stelle:

“Não vou por ibopes, e sim pela lei natural, pela sensibilidade, e pela razão. E leio as entrelinhas das conversas com parentes e outros no Brasil, por telefone ou quando visito. O tom de voz, as respostas descuidadas, as projeções da Síndrome de Estocolmo, o que Ayn Rand denominou “a sanção da vítima” - tudo isso mostra o efeito da desinformação petista. Isso não ocorre só com eles, mas no país todo. Além disso, o Lula não banca na classe média; a base dele está na classe baixa, que é a maior. Uma clínica de bairro que salva uma criança, ou dispensa um remédio grátis, vale mais que um quarteirão da burguesia, que já é socialista de certo modo, quando não de verdade. Classe média e alta é sobremesa; come se tiver”.

Para concluir, resumo a minha opinião em simples constatações:

- os maiores conglomerados do mundo, os bancos que giram com fortunas imensuráveis, as empresas aéreas, a Nasa que lida com um orçamento bilionário, e até o Pentágono, que teoricamente deveriam operar com os softwares mais indevassáveis, ainda hoje sofrem ataques permanentes de crackers (termo usado para designar quem quebra um sistema de segurança, de forma ilegal ou sem ética – o termo foi criado em 1985 pelos hackers em defesa contra o uso jornalístico do termo hacker). Se a sua memória não é curta, prezado eleitor brasileiro, deve se lembrar de recente episódio no Senado – invasão do painel de votação - que inclusive originou a renúncia do todo poderoso Senador Antonio Carlos Magalhães.

- o questionamento, analisando a situação com a frieza e imparcialidade que o assunto requer, não é a urna propriamente dita - não conheço sua sistemática interna e nem vem ao caso conhecê-la. O problema é o depois: o day after. É a manipulação (termo que pode – e na verdade é o que pretendo - produzir interpretação ambivalente) que sofre o processo quando os dados são totalizados e passam a ser digitados manualmente. É o ponto fraco, o calcanhar de Aquiles. Morreu o controle. Foi-se a garantia. Acabou a confiança – o processo passa a ser humano e todos nós sabemos que nestas condições a falibilidade se diz presente.

- quais os motivos das grandes potências, com inegável superioridade sobre nós, tanto em hardware como em software, até hoje não utilizarem semelhante sistema?

Lamento. Como brasileiro e programador, gostaria de acreditar na lisura e na infalibilidade do sistema, mas quem afirma que as urnas eletrônicas são à prova de fraude, provoca risos na comunidade ligada à informática – e não são poucos.

As urnas eletrônicas e a zerézima


Por Davi Castiel Menda, matemático de Gravataí (RS)

"Hecha la ley, hecha la trampa." ditado popular.

O Titanic, em sua viagem inaugural, ao zarpar de seu porto de origem, ostentava o título de insubmergível, e era tanta a autoconfiança do engenho humano, que os jornais da época afirmaram que "Nem Deus poderia afundar esse navio". Bill Gates, o papa da informática, em 1981, nos brindou com a pérola "640 kb de memória é mais do que suficiente para qualquer um". Thomas Watson, presidente da IBM, em 1943: "Penso que há talvez no mundo um mercado para cinco computadores". Mas a campeã das afirmações estapafúrdias deva ser creditada a Charles Duell, Diretor do Departamento de Patentes dos Estados Unidos, em 1899: "Tudo que podia ser inventado, já o foi", propondo inclusive o fechamento dos escritórios que dirigia. Pelos exemplos, concluímos, já no início do artigo, de que afirmações exageradamente desmedidas tendem, com o passar do tempo, a mostrar-se equivocadas, quando não beirando ao ridículo.

Implantada no Brasil em 1996, a votação eletrônica, segundo o TSE, baniu de vez a possibilidade de fraude eleitoral, com a afirmação dogmática de que o sistema é seguro, indevassável. Entretanto, estas condições até hoje são questionadas por estudiosos, programadores, os próprios partidos, e porque não, por boa parcela da população brasileira.

Alguns defensores das urnas eletrônicas, na ânsia de afirmar que o sistema é infalível, declaram com ares de ufanismo simplório que o Brasil, ao comercializá-las para outros países, está exportando democracia(!), embaralhando comércio e tecnologia com patriotada. Paulo Gustavo Sampaio Andrade, editor do site Jus Navigandi, traduz de forma muito simples e direta a opinião de quem põe em dúvida a assertiva governamental: "Se o sistema eletrônico eleitoral é imune a fraudes, considerada uma suposta perfeição técnica e a natureza biológica das pessoas envolvidas" - compara ele - "o sistema financeiro já teria adotado o projeto e contratado as pessoas que criaram e utilizam o sistema eleitoral eletrônico para pôr fim aos inúmeros golpes existentes, por exemplo, nos caixas eletrônicos e nos bancos via internet".

A desconfiança baseia-se em dois pontos cruciais. O primeiro, é saber se realmente o voto digitado a um determinado candidato é realmente computado e creditado a ele. O segundo questionamento é a probabilidade de violação da identidade do eleitor, a exemplo do acontecido em recente episódio no Senado, quando determinado grupo teve acesso a quem votou em quem.

O Eng. Amílcar Bruzano Filho, um especialista na área, compara a urna eletrônica à "uma máquina de votar inauditável, uma verdadeira caixa preta da qual nenhum partido político, fiscal ou auditor externo ao TSE, jamais teve acesso para conferir sua integridade". E complementa Bruzano: "o que o TSE chama de auditoria é colocar alguém em frente à urna. Isso não é o processo de exame de um sistema, mas um artifício. Um show".

O povo em geral - onde eu me insiro - pouco acesso tem ao assunto, mas pesquisando, toma-se conhecimento de que existem dois Sistemas Operacionais vigentes: o VirtuOs (que pertence a uma empresa privada) e o Windows CE, com mais de seis mil programas e dois milhões de linhas de código, tornando muito difícil a sua análise, se é que estão disponíveis. Esta falta de transparência é que compromete o primeiro pilar de um legítimo processo eleitoral: a votação.
Os outros dois são a apuração e a fiscalização. A fase de apuração nos remete às eleições de 1982 no rio de Janeiro e a famigerada Operação Proconsult, nome da empresa encarregada de proceder à apuração e que teve como objetivo "virar" os resultados de uma eleição já ganha por Leonel Brizola sobre o candidato do Governo federal na época, Moreira Franco. A sistemática consistia em sonegar os resultados da capital (dois terços do eleitorado), onde Brizola alcançara 70% dos votos, e só divulgar uma média da apuração no interior do estado, onde Moreira era majoritário. Não fosse a pronta intervenção de Brizola, exigindo falar à nação pela Rede Globo - que insistia em divulgar a vitória de Franco - a história seria diferente. Quanto à fiscalização, é totalmente inócua - se é que existe - fator que provoca a incredulidade no sistema.

Existem n maneiras possíveis de fraude na votação, o TSE tem a obrigação de conhecê-las e toda a comunidade digital espera que as coíba com sucesso, mas nada impede de enumerá-las: clonagem de urnas; engravidamento da urna, com mesários em conluio na ausência de fiscais; fraude na apuração, já que o boletim de urna impresso quando do encerramento da eleição nem sempre é entregue ao fiscal; possibilidade de fraude no programa implantado na urna; adulteração dos programas originais implantados nas urnas; e por último, o maldito vírus - e por trás dele os crackers - que tanto mal tem causado em todas as áreas de atuação onde o computador está presente.

Mas afinal, o que é zerézima, presente no título deste artigo? È o neologismo criado pelos técnicos do TSE para indicar que cada candidato, no início do processo eleitoral, tem na verdade zero votos. É a garantia de que todos partem realmente do zero. Lamentavelmente, não é garantia nenhuma, já que qualquer programador, mesmo principiante, sabe perfeitamente que é possível digitar algo, a impressora reproduzir este algo, mas armazenar "o que se quer" na memória do computador. É uma pena que toda a garantia que o TSE nos ofereça seja apenas a zerézima, ou seja, zerézima garantia.

domingo, setembro 17

Não boto fé nessas urnas


Por João Ubaldo Ribeiro, escritor
O Globo, 17-09-2006

Às vésperas de exercer o estranho direito obrigatório de votar, tenho notado que algumas pessoas com quem converso estão nervosas com estas eleições.

Mas não pelas razões habituais, ou seja, por entusiasmo, vibração, esperança, ou o que lá seja. Isso não vi em ninguém, a não ser nuns poucos que encaram a política como uma espécie de religião de bases imutáveis, com seus deuses e santos incriticáveis e infalíveis.

Esses são de lascar, porque, como com outros fanáticos, não adianta apresentar fatos ou argumentos, pois contra a fé estes não adiantam nada.

Mas, mesmo eles ficam na defensiva, preferindo não provocar ataques e seguir o exemplo de Nosso Guia, que é não debater nem responder a perguntas inconvenientes ou irresponsáveis.

Para mim e, tenho descoberto, para bem mais gente, reapareceu, com a cara piorada, a desconfiança em relação ao nosso moderníssimo sistema de votação eletrônica, tão moderno que, como já disse aqui, diversos países, inclusive vários do famoso Primeiro Mundo, o estudaram e nem pensaram em adotá-lo. Os defensores do sistema, notadamente os oficiais, dirão que estou dando palpites de absoluto leigo - e leigo e burro, por sinal. Até não me incomodo com nenhum dos dois qualificativos, pois bem posso ser merecedor, mas a verdade é que muita gente capacitada concorda comigo.

Tudo em informática é inseguro.

Claro, nada, em área nenhuma, é absolutamente seguro, mas a informática é um terreno onde tudo se passa vertiginosamente. Lembro-me quando os bancos se consideravam à prova de fraudes eletrônicas e eu mesmo fui tungado através de um banco cujos funcionários me torciam o nariz, me dizendo como o comandante do Titanic que os seus sistemas eram à prova de invasão. Não adiantava argumentar que, se entram até em sistemas do Pentágono, entrariam num tamborete brasileiro com um pé nas costas, como já aconteceu.

Nosso sistema, em primeiro lugar, não é inviolável nem à prova de erros, muitíssimo pelo contrário. Segundo me informam, as urnas podem perfeitamente ser invadidas sem necessidade de remoção do lacre. A alteração de uma ou duas linhas nuim programa de milhões e milhões de linhas pode gerar a eleição ou não-eleição de muitos candidatos. O anonimato, que dizem ser garantido, de fato não é. Em rigor, pode-se dizer (os técnicos do governo vão comentar que sou mais leigo burro ainda do que eles pensavam, mas é verdade) que, ao menos tecnicamente, o voto secreto acabou.

O rol de males que um sistema vulnerável, inverificável e, se não danoso ou perigoso como creio, é pelo menos objeto de controvérsia entre especialistas, não pode deixar de causar apreensão. E os que não estão comprometidos co, digamos, o esquema, de modo geral desaprovam o sistema.
Ou seja, mesmo que o sistema fosse tudo de perfeito que se diz dele, a mera controvérsia técnica traz perigos adicionais, agora, por exemplo, que assistimos ao problema do México, o qual, ao contrário de nós, ainda pode conferir os votos.

E quem pode fraudar as urnas eletrônicas? Ah, neste nosso Brasil varonil onde a bandidagem medra em ritmo febril, imagino (sim, sou paranóico - cartas de protesto ao editor, por caridade) poder haver já quadrilhas montadas em vários estados importantes, não inspiradas por motivos ideológicos ou partidários, mas por grana mesmo, como costuma ser o caso aqui, para prestar serviços tipo "converta dez por cento dos votos nulos ou em branco para você". As urnas podem, na verdade, ser fraudadas por qualquer um que tenha qualificação, notadamente alguém com acesso, direto ou indireto, a algum ponto do sistema.

Sim, eu sei, por ética e honestidade, ninguém faria esse tipo de coisa - só tem feito muito ultimamente porque é uma espécie de fase passageira, como esses vírus de sete dias. Já foram publicadas diversas suspeitas quanto ao funcionamento das urnas e nada foi explicado satisfatoriamente.

Somente pensar se, por acaso, a eleição presidencial, contrariando as pesquisas até agora, for a segundo turno, não tenho dúvida de que, a depender das circunstâncias, a questão das urnas pode aparecer logo, começando pelo fato de que as pesquisas se terão revelado extraordinariamente erradas.

"Pesquisa não vale nada", dirá o vencedor.

"As urnas foram fraudadas", dirá o perdedor. A depender das circunstâncias, como já disse, a questão das urnas pode logo centralizar a discussão e multiplicar acusações de lado a lado.

E, vamos pensar só por hipóteses, pois afinal tudo é possível nessa vida, que a decisão seja mesmo no segundo turno e apertada. Em toda a parte do mundo, inclusive nos Estados Unidos, a solução é apelar para a recontagem, mas aqui ela ou é impossível ou não significa realmente uma recontagem, mas uma reprodução em disquete de algo que já está lá de forma fraudada. A depender de quem vença e quem o esteja apoiando, notadamente fora da esfera governamental, o povo pode sair às ruas, para mostrar que está verdadeiramente ao lado do vencido e que o resultado se terá devido às urnas eletrônicas.

Quanto ao vencedor, dirá que nada merece mais confiança que as urnas e que o vencido quer reverter a escolha popular, claramente expressa, através do sistema mais moderno. "Golpe", dirá um lado. "Golpe", dirá o outro.

Tenho mais material comigo, mas acho que todo mundo considera essas minhas preocupações mais uma das minhas esquisitices que nunca cometi mas que me deixaram famoso pela - digamos bondosamente - excentricidade.

Ninguém, a não ser os quatro ou cinco gatos-pingados em que me incluo, dá a menor importância.

Bom, pensando melhor, talvez tenham razão. Não parece haver lá muito interesse no que dirão as urnas, como se todos soubessem que o que vem aí é a lesma lerda, que a gente encara como sempre encarou.

quinta-feira, setembro 14

A urna eletrônica e as vozes do deserto


por Ilton C. Dellandréa
Desembargador e Juiz Eleitoral, aposentado, do Rio Grande do Sul


Parecem vozes do deserto soando em vão. Os ventos não sopram ondas sonoras para o Planalto e os que gritam aqui em baixo estão sozinhos. Os raros ecos que chegam lá encontram ouvidos entupidos por bolores dogmáticos e fervorosos que obliteramconsciências e se impõem aos que apenas podem gritar.

A Imprensa, que bem ou mal, é a amplificadora das grandes mazelas politiqueiras, como as do mensalão, dos correios, dos sanguessugas e outras que não adianta relacionar porque vai apenas esgotar os limites de caracteres do post, também parece dormente, acalentada pelo canto de sereias, sem se animar a perseguir mais fundo o dever de informar e divulgar denúncias. Mais interessa o fato consumado da briga de foice, de preferência com vítimas sanguinolentas – dá mais Ibope – do que amplificar vozes do deserto para que elas, como os caminhões de som dos candidatos que passam pelas ruas nesta época, atormentem, ou pelo menos, obriguem a ouvir os que não querem ouvir. Para que depois não digam que não foram alertados.

O que está ocorrendo – ou melhor – o que não está ocorrendo com as denúncias de que a urna eletrônica é fraudável? Ninguém dá a mínima. Domingo, no Roda Viva, o jornalista Joelmir Betting, iniciou o que pensei fosse um questionamento ao Ministro Marco Aurélio, presidente do TSE, sobre o assunto. Pura esperança! Além de não questioná-lo partiu do pressuposto de que ela é infalível para indagar sobre seu uso futuro.

Parece que todos os setores da sociedade brasileira se uniram num conluio perverso e universal para evitar um problema crucial e deixaram de lado os poucos que berram. Será que esses poucos são loucos conspiradores e inimigos do Estado e do sistema eleitoral? Será que o livro dos doutores Brunazo e Cotriz (Fraudes e Defesas no Voto Eletrônico) é apenas um panfleto mal intencionado, que visa gratuitamente desacreditar a instituição dogmática e fechada(?) da ungida urna eletrônica? E o Voto Seguro, é igualmente apenas panfletário? Será que ninguém vai dar bola para o que escrevo aqui, não porque sou eu que escrevo, mas porque o assunto é grave? Não interessa que seja eu, sou capaz de andar troteando para demonstrar que sou burro, mas o que estou dizendo não é fruto de imaginação. Já vi muitos burros terem lampejos instintivos de absoluta lucidez e muitos inteligentes fazerem besteiras com galhardia acreditando-se gênios.

Ninguém está pedindo que as urnas eletrônicas sejam dispensadas. Apenas que nos dêem a certeza de que o candidato cujo número digitaremos nelas seja exatamente aquele que receberá nosso voto. É pedir demais?

O computador, quando surgiu, era confiável. Poucos admitiam a possibilidade de o “cérebro eletrônico” errar e era louco quem ousava desacreditá-lo – eu era programador quando os primeiros computadores, aqueles enormes mainframes, chegavamao Brasil e o da Telesc, em Santa Catarina, da Burroughs, era um dos mais modernos da época. Dizia-se que não fora escolhido um IBM, mais sólido no mercado, por que esta empresa mantinha uma rede de espionagem mundial através de seus computadores.

Quem, ao se iniciar no mundo computadorizado, acreditava que podia ser vítima de hackers, de vírus, de espiões e de bugs? Eu não. Mas eles estão aí. São uma realidade apenas menos visíveis que os programas legais.

Os senhores do Planalto passam por uma fase de deslumbramento com a urna eletrônica e não admitem que ela possa ser mal utilizada. É um dogma eleitoral e só loucos procuram destruir dogmas. Galileu, Freud e Darwin? Loucos! Apenas loucos porque destruíram mitos e dogmas.
A urna eletrônica foi parida de repente, sem a segurança das coisas que nascem pequenas e aos poucos vão se consolidando com firmeza, é o Sol que gira ao redor da Eleição, é a ausência do inconsciente e do subconsciente eleitoral.

Quando os gênios do Planalto, hoje de olhos e ouvidos fechados, atinarem para essas verdades muita injustiça terá sido cometida. Talvez seja tarde.

terça-feira, setembro 12

Partidos políticos ainda não fiscalizam urnas eletrônicas


Por Patricia Peck

O Brasil foi o primeiro país a adotar a votação totalmente informatizada, a partir de 1996. A urna eletrônica merece nossa total admiração. Com ela, a velocidade de processamento de uma eleição passou a ser de horas, em vez de semanas. O resultado, com a automatização do sistema, tornou-se mais confiável, eliminando uma quantidade enorme de fraudes. Contudo, abriu portas para novos tipos de fraude ­ as fraudes eletrônicas.

A confiabilidade do processo eleitoral depende crucialmente do controle transparente de todas as etapas de sua condução, exercido pela sociedade por meio dos partidos políticos, dos fiscais, dos mesários, dos juízes e dos próprios eleitores.

Contudo, a fiscalização dos programas de computador por meio da análise dos programas e verificação das assinaturas digitais, como regulado pela Lei 10.740 de 2003, foi simplesmente ignorada pela grande maioria dos partidos políticos que não se habilitaram a fiscalizar o voto eletrônico. As eleições de 2004 demonstraram cabalmente que os partidos políticos não estavam preparados tecnicamente e nem tinham recursos financeiros necessários para efetuar este tipo de fiscalização de alto nível tecnológico.

A corretude dos programas instalados nas urnas eletrônicas está exclusivamente com os técnicos do TSE. Sendo sua compilação complexa, impossibilita a verificação por terceiros das opções empregadas e de possibilidades de auditoria no prazo estabelecido em lei.

É o caso da utilização, até o presente, de alguns programas fechados de computador, como o Sistema Operacional VirtuOS, utilizado em mais de 350 mil urnas eletrônicas, cujo código-fonte em si, que foi adaptado, o TSE nunca apresentou para fiscalização dos partidos políticos.

Os relatórios técnicos elaborados por entidades acadêmicas da área de tecnologia da informação, como o Relatório Unicamp, sobre o sistema eleitoral de 2000, e o Relatório da SBC ­ Sociedade Brasileira de Computação sobre o sistema eleitoral de 2002 apontaram este problema de falta de eficácia da fiscalização dos partidos permitida pela regulamentação da Justiça Eleitoral, como atestam estes parágrafos seguintes:

"Não há mecanismos simples e eficazes que permitam que representantes de algum partido, em qualquer lugar do país, possam confirmar que os programas usados na UE correspondem fielmente aos mesmos que foram lacrados e guardados no TSE" (extraído do Item 4.3 do Relatório Unicamp de 2000)."

Apesar de avaliar a auditabilidade e o sigilo do voto ser uma parte explícita da missão da Unicamp, acreditamos que a urna atual não é auditável, e tampouco protege adequadamente o sigilo do voto" (extraído do Item 1.4 do Relatório SBC de 2002).

Podemos pensar em inúmeras possibilidades de fraudes nas urnas eletrônicas, ocorrendo em todos os processos, deste a geração do código-fonte do programa (inserindo alguns scripts maliciosos), durante a inseminação das urnas (desconfigurando as urnas para as seções), antes da abertura da seção (rompendo os lacres para modificar os programas, ou até mesmo trocando a urna legítima por uma falsa), durante toda a votação (teoricamente é possível o acesso indevido à memória flash da urna). Supondo que não houve fraude alguma em nenhum processo, é necessário ainda garantir que os resultados cheguem sem modificações no TRE.

Existem outros ataques, que teoricamente são possíveis e muito mais prejudiciais, onde a implantação de um determinado programa troca o código da tecla pressionada por um outro código. Com isso, a urna exibe a foto de um candidato diferente daquele escolhido pelo eleitor, ou pior, poderá ser exibida a foto do candidato escolhido pelo eleitor, mas ter o voto contabilizado para um candidato diferente.

O conteúdo da urna recebe criptografia, o que lhe confere já uma maior garantia de proteção de integridade. Mas em segurança da informação, é sempre importante ser capaz de periciar o ambiente e as evidências, o que seria feito por um processo de auditoria.

Outra questão bastante polêmica é a possibilidade do voto do eleitor ser vinculado a ele, quando da digitação do número do título eleitoral em um terminal conectado à urna eletrônica:

"O presidente da mesa digita o t tulo do eleitor num equipamento chamado micro-terminal fisicamente conectado à urna. Com isto é muito simples relacionar eleitores com votos. É só registrar, em separado, as teclas do micro-terminal e da urna. Contudo, trata-se somente de uma possibilidade. Em nossas investigações não foi encontrado qualquer vestígio desta possibilidade ter sido implementada. No entanto, este é um desconforto que o eleitor não precisaria ter.” ­ extraído do Item 3.3 do Relatório Unicamp de 2000.

As novas leis sobre máquinas eletrônicas de votar que estão sendo elaboradas nos países mais avançados em tecnologia de computação estão, sem exceção, exigindo que, além do voto em sua forma virtual, sempre exista o voto materializado e mostrado para conferência do eleitor antes de ser guardado em uma urna convencional lacrada e também se tem exigido o estrito uso de software aberto nas máquinas de votar e apurar. Até 2004, mais de 10 estados dos Estados Unidos já decretaram que urnas eletrônicas devam utilizar software aberto e devam emitir o voto impresso conferido pelo eleitor para posterior conferência da apuração. Em 2005, quatro projetos de lei neste sentido foram apresentados no Congresso Nacional norte-americano.

Considere-se, também, o ocorrido na apuração dos votos no Referendo na Venezuela, em agosto de 2004, onde as urnas eletrônicas utilizadas emitiam o voto impresso conferido pelo eleitor. A oposição, derrotada, declarava não aceitar os resultados oficiais e a situação política caminhava para um impasse de solução conflituosa. A solução para o impasse, proposta pela OEA e pelo Centro Carter como observadores internacionais, foi promover uma auditoria estatística por recontagem dos votos impressos de 1% das seções eleitorais. Somente após a conferência da apuração eletrônica por meio da recontagem estatística dos votos impressos conferidos pelo eleitor que os vencidos aceitaram e deixaram contestar os resultados oficiais.

Um projeto de lei (PLS 100/05), do senador Augusto Botelho, sobre a auditabilidade do sistema informatizado de eleições brasileiro, pretende que cada voto seja impresso para conferência visual pelo eleitor (sem manuseio), a fim de possibilitar auditoria.

A impressão do voto é um mecanismo que dá muita confiabilidade e transparência ao sistema eleitoral, por ser um mecanismo que registra a vontade do eleitor. Com isso, a urna ganha uma nova propriedade: ela torna-se auditável, porque há possibilidade de recontagem, abolindo a impressão do voto, deve-se estudar outras tecnologias para conseguir a sua comprovação e auditabilidade.

A urna eletrônica é uma evolução e, como tal, ainda está sujeita a melhorias de modo a garantir o exercício democrático dentro de um regime legal adequado, capaz de ser auditado se houver suspeita de algum incidente ou fraude. Acreditamos que deve ser desenvolvido um processo que permita auditoria e seja independente da impressão do voto. Aguardamos por esta inovação, quem sabe para as próximas eleições.

Revista Consultor Jurídico, 12 de setembro de 2006

Sobre o autor


Patricia Peck: é estrategista jurídica, consultora especializada em Direito Digital, Tecnologia da Informação e Risk Management, e autora do livro DireitoDigital (Saraiva, 2002).

segunda-feira, setembro 11

Voto virtual


Especialistas analisam riscos da urna eletrônica
Por Priscyla Costa


Já integra o senso comum da política brasileira a noção de que a votação eletrônica, implantada no Brasil há 10 anos, baniu a possibilidade da fraude eleitoral — um câncer que comprometeu as eleições no país desde a instalação da República. Mas para um grupo de estudiosos do voto eletrônico, contudo, o sistema é tão infalível quanto o Papa.

Para o advogado Paulo Gustavo Sampaio Andrade, editor do site Jus Navigandi, a certeza de que a urna eletrônica é 100% segura lembra a idéia que se fazia do Titanic e das torres do World Trade Center antes do desastre. “Se o sistema eletrônico eleitoral é imune a fraudes, considerada uma suposta perfeição técnica e a natureza biológica das pessoas envolvidas” — compara ele — “o sistema financeiro já teria adotado o projeto e contratado as pessoas que criaram e utilizam o sistema eleitoral eletrônico para pôr fim aos inúmeros golpes existentes, por exemplo, nos caixas eletrônicos e nos bancos via internet”.

Essa indagação não perpassa o Tribunal Superior Eleitoral. Na semana passada, o presidente do TSE, ministro Marco Aurélio, reafirmou a confiança na votação eletrônica: “uma das experiências mais exitosas do país, na medida em que logramos afastar o manuseio das cédulas”, a partir das eleições municipais de 1996. “De lá para cá, não tivemos nenhuma impugnação de substância, de peso” contra a lisura das urnas, reafirmou.

Embora insista em que "as eleições no Brasil são seguras e transparentes", com o advento da votação eletrônica, ele admite que a segurança tecnológica pode ser reforçada. O sistema, explica o tribunal, é um conjunto de ferramentas criado para garantir um processo eleitoral limpo — previsto em resolução com força de lei, para responder às questões levantadas por membros de partidos ou representantes de órgãos como a OAB e o Ministério Público.

De acordo com Giuseppe Dutra Janino, secretário de Tecnologia da Informação do Tribunal Superior Eleitoral, os partidos políticos, representantes da OAB e Ministério Público podem acompanhar o desenvolvimento do sistema desde a concepção dos programas até a última versão. Tudo é feito seis meses antes das eleições, para, em caso de contestação, viabilizar as correções e melhorias.

Depois, vem a assinatura digital e a lacração do sistema — fase que a Justiça Eleitoral iniciou nas duas últimas semanas. Os programas são submetidos a um algoritmo matemático. Essa “senha” verifica tudo o que está instalado na urna e gera no final um identificador, que é a assinatura digital.

O dado de cada candidato também é protegido por assinatura eletrônica. “Faz-se uma conferência quanto ao conteúdo da programação”, explica Janino. Mas não é só isso, diz o texto. “O TSE faz um ‘resumo’ de todo programa instalado. Chamamos isso de hash. É o controle matemático do que está inserido na urna. Depois de todos os testes, esse ‘resumo’ é colocado na internet. O representante do partido está credenciado para acessar sempre que achar necessário. O hash só é feito para afastar a alegação de não integridade do produto”, esclarece.
Quando as urnas são distribuídas para os Tribunais Regionais Eleitorais seu conteúdo fica inacessível. Na véspera da eleição, é promovido um sistema de votação paralela. Os TREs sorteiam algumas sessões eleitorais, levam as urnas e reconstituem uma eleição. Tudo monitorado. No final desse processo, os técnicos verificam se o que foi digitado na urna corresponde com o total de votos impresso no comprovante.


Questionamentos

O procedimento informado pelo TSE é discutido por um grupo que defende que não há, no Brasil, um software capaz de assegurar uma eleição limpa, como anuncia o tribunal.

Paulo Gustavo Sampaio Andrade identifica dois problemas básicos no sistema. O primeiro é verificar se o voto digitado foi realmente computado para o candidato correspondente. O segundo item é a possibilidade de violação da identidade do eleitor.

“O mesário digita o número do título em um teclado conectado à urna. A urna responde se o eleitor está devidamente cadastrado. Existe a possibilidade de a informação sobre o título ser associado ao voto. Ou seja, pode-se saber quem votou em quem”, afirma.

Segundo Paulo Andrade, essa não é uma acusação infundada. “Há 10 anos discute-se a segurança do voto no Brasil. Todos os pesquisadores, brasileiros e americanos, são unânimes em dizer que o sistema não é confiável. Não dá para fingir que está tudo certo”.

O que o advogado indica como sistema ideal é o voto impresso. Isso não significa dizer que haverá manuseio de papel pelo eleitor. O voto será apenas exibido em um visor. Se o eleitor verificar que está tudo certo tecla “Confirma”. O papel é depositado em uma caixa, anexa à urna. A medida serviria para apurar possível fraude no sistema ou refazer a contagem de votos, caso fosse necessário.

“O grande problema é que hoje não há auditoria. Além disso, dois essenciais programas não são colocados à disposição do partido: o sistema operacional e o módulo de segurança, usando justificativas incabíveis. Esse método de fazer segurança por obscuridade não vale. Segurança se faz com publicidade. Tem de comprovar que os programas colocados nas urnas de todo o país foram os mesmos testados pelo pessoal do TSE. O problema é que todo mundo acha o sistema lindo. Mas ninguém tem conhecimento técnico para aferir isso.”

Para Amilcar Brunazo Filho, engenheiro e supervisor do Fórum do Voto Eletrônico, grupo que discute a segurança da votação digital, a indicação de que o sistema eleitoral é duvidoso é o fato de que no mundo inteiro se tem mais cautela. Estados Unidos e Venezuela também estudam esse sistema de voto, mas com a possibilidade de fazer auditoria. “Não a auditoria que o TSE admite fazer. Mas sim a contagem de voto por voto.” Para Brunazo, “o que o TSE chama de auditoria é colocar alguém em frente à urna. Isso não é o processo de exame de um sistema, mas sim um artifício. Um show”.

Para justificar seu argumento, Brunazo cita o caso da empresa Microbase. Fornecedora do VirtuOS — sistema operacional que equipa parte das urnas eletrônicas — a empresa divulgou nota de esclarecimento dizendo que seu software nunca foi auditado.

“A legislação em vigor exige a auditoria de todos os programas-fonte do Sistema de Eleições Eletrônicas, mas a regra nunca foi adequada e rigorosamente obedecida pelo TSE, de modo a dar a necessária e devida credibilidade ao processo de Assinatura Digital e de Lacração dos Sistemas para as Eleições Oficiais”, diz a direção da empresa na nota.

A Microbase ainda afirma que “denúncias de fraudes eleitorais estão sendo comprovadas de modo irrefutável. Denúncias que, de algum modo, podem vir a nos envolver como fornecedores de uma peça importante do ‘software’ utilizado nas Urnas Eletrônicas”.

Também sustenta que há “descompromisso do TSE na condução de certos aspectos importantes que envolvem as Eleições Eletrônicas”, o que resultou, “inclusive, em nossa denunciação à lide, numa ação judicial milionária de ressarcimento pela eventual apropriação indébita de ‘propriedade intelectual’ do Sistema de Votação Eletrônica”.

O fato é que apesar das suspeitas e dúvidas levantadas, nunca foi feita uma denúncia concreta de fraude do sistema eletrônico de votação.


Outras vozes

Hélio Freitas, advogado do PT, especialista em Direito Eleitoral, aposta na segurança do voto eletrônico. Ele conta que no ano de 2000, advogados dos partidos pediram para o Tribunal Regional Eleitoral paulista selecionar algumas urnas para a simulação de votos. A solicitação foi aceita. Feita a contagem dos votos, não se teria constatado qualquer irregularidade.

“O sistema foi bem desenvolvido. O Brasil é pioneiro nessa questão. Só existiu fraude no sistema passado. Minha única ponderação é sobre o sistema de envio de votos dos TREs para o TSE. Isso se dá por mais deficiência minha do que do sistema. Advogados de partidos não fazem qualquer reserva ou questionamento sobre o processo. Todos elogiam muito”.

Para Alberto Rollo, presidente do Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo, não dá para dizer que o sistema é 100% seguro, como também não se pode levantar a questão de possibilidade de fraude sem apontá-la objetivamente. Rollo diz que poderia haver duas possibilidades de o sistema apresentar falhas: a primeira na computação dos votos. A segunda seria a instalação de um vírus. Mas não enxerga motivos para crer que haja brechas para isso.
“No final das eleições, o representante partidário recebe um documento oficial do TSE com o número de votos. Se houver divergência com o resultado divulgado, ele pode confrontar a informação. No caso do vírus é ainda mais difícil. Sete programas são instalados na urna eletrônica. Se for instalado um vírus teremos então oito programas. A fiscalização vai constatar a fraude. A eleição estará nula. É simples.”

O que Alberto Rollo defende como medida eficaz é a fiscalização de pelo menos 1% nas urnas eletrônicas. Hoje, na cidade de São Paulo, por exemplo, só duas urnas são levadas para a votação paralela. “Isso não comprova nada. Se há dúvida, o melhor é que se faça o teste em uma pequena porcentagem. Isso já acabaria com várias alegações de fraude”, acredita.


Questões pendentes

Na linha dos especialistas que se dedicam a desmistificar a idéia de que o sistema eletrônico eleitoral é, por natureza, imune a fraudes há ponderações que não se pode ignorar.

Afinal, crer que no país do Mensalão, dos Anões do Orçamento e da delinqüência habilidosa que enlouquece os técnicos encarregados de conter invasão de sites, clonagem de telefones e cartões de crédito, haja um sistema milagroso à prova de falhas ou truques, seria ingenuidade.
Paulo Andrade raciocina: “o sistema eletrônico não tem o condão de tornar bonzinhos os fraudadores”. A trilha natural de quem sabe o valor de uma vitória eleitoral, diz o advogado, é aperfeiçoar-se para explorar os espaços existentes. Espaços que, acusa, o TSE não se esforça para bloquear.

A crença generalizada da infalibilidade da "eleição eletrônica", diz Andrade, desmobilizou os partidos políticos (e os fiscais por eles designados) que se acomodaram e diminuíram o rigor da fiscalização — situação calcificada pela falta de investimento em técnicos e técnicas de precaução para eventuais desvios.

O livro Fraudes e defesas no voto eletrônico, de Amílcar Brunazo Filho e Maria Aparecida Cortiz (All Print, São Paulo, 2006) elenca 12 maneiras pelas quais pode ser fraudada a eleição eletrônica (do cadastro eleitoral à totalização).


Paulo Andrade selecionou cinco tipos de fraudes de maior repercussão:

A — Fraudes na votação

Votação é a colheita dos votos individuais de cada eleitor. Nas urnas eletrônicas brasileiras, os votos individuais somente existem virtualmente. Não existe nenhum documento impresso que materialize a existência de um voto individualmente considerado.

Fraude nº 1 Clonagem de urnas eletrônicas:

1.1. Como ocorre esta fraude: consiste em trocar as urnas eletrônicas verdadeiras, registradas pelo TSE, por urnas eletrônicas "clonadas", também verdadeiras mas não registradas pelo TSE. Enquanto os eleitores votam na urna "clonada", a urna verdadeira é alimentada por votos fraudulentos em outro lugar. Depois da votação, o presidente da seção deve emitir o boletim de urna e conduzir todo o material no local da totalização dos votos em seu próprio carro. No caminho, porém, ele a trocará pela urna verdadeira, com os votos e o boletim de urna fraudulentos. Há outras variações, em que a votação fraudulenta pode ser feita em outro horário.
1.2. Quem pode fazer esta fraude: exige participação do presidente da seção + algum agente interno da Justiça Eleitoral (ou empresa terceirizada) que forneça a urna "clonada".
1.3. Como evitar esta fraude: os fiscais devem exigir uma via do boletim de urna, no momento em que este for impresso pela urna eletrônica, ainda dentro da seção eleitoral, para compará-la com a outra via do boletim de urna que será entregue pelo presidente da seção à Justiça Eleitoral, para totalização. Problemas: 1 — este cuidado é constantemente omitido pelos partidos e pelos fiscais, confiantes de que o sistema é 100% seguro; 2 — neste ano, o TSE baixou a Resolução nº 22.154/2006, que desobriga os mesários de fornecer uma via do boletim de urna aos fiscais dos partidos.
1.4. Exemplo desta fraude: Guarulhos, 2004.

Fraude nº 2 — Engravidamento de urnas eletrônicas:

2.1. Como ocorre esta fraude: num momento em que a seção eleitoral estiver com pouco movimento, no final da tarde, os mesários, em conluio e na ausência de fiscais, podem votar no lugar de eleitores que ainda não compareceram. Para tanto, basta digitar o número do título de um eleitor que ainda não compareceu, que consta dos cadernos em que os eleitores assinam sua presença. Se, por acaso, algum eleitor cujo título tenha sido digitado fraudulentamente aparecer nos últimos instantes da votação, basta escolher outro número de título de eleitor que não tenha comparecido e digitá-lo para liberar a votação do que compareceu.
2.2. Quem pode fazer esta fraude: os mesários em conluio (até mesmo algum fiscal pode ajudar na fraude); a fraude se torna mais fácil se for na eleição proporcional (para deputado ou vereador), pois cada um dos presentes vota no seu candidato.
2.3. Quem pode evitar esta fraude: os fiscais. Problema: 1 — os partidos confiam na "urna 100% segura" e enviam apenas um representante para várias seções, quando enviam; 2 — os fiscais, também crédulos, se ausentam das seções por várias horas.
2.4. Exemplo desta fraude: Marília, 2004.

B — Fraudes na apuração:

Apuração é a soma dos votos de uma única urna.
Nas urnas eletrônicas brasileiras, a apuração é feita dentro da própria urna eletrônica, pela soma dos votos em sua memória.
O único documento da apuração é o boletim de urna, impresso pela urna ao final da votação, que nem sempre é entregue aos fiscais.

Fraude nº 3 — Fraude no programa original da urna

3.1. Como ocorre esta fraude: os programas originais das urnas eletrônicas, gerados pela Justiça Eleitoral e distribuídos para todo o Brasil podem já — em tese — conter arquivos que determinem o desvio de votos, de forma genérica para todas as votações.

Trata-se de uma fraude de largo alcance, que pode eleger um candidato a qualquer cargo. Uma fraude já existente no software original da urna pode desviar votos para um partido político de forma genérica (votos para legenda em candidatos a deputado) ou então atuar de forma específica (por exemplo, quando a foto do candidato contiver um determinado texto oculto que funcione como senha).

3.2. Quem pode fazer esta fraude: programadores desonestos que trabalhem ou prestem serviços à Justiça Eleitoral, com acesso privilegiado ao código-fonte dos programas. Também poderia ser inoculada, sem conhecimento do TSE, por atacantes externos que consigam invadir os computadores da Justiça Eleitoral (utilizando vírus, cavalos-de-tróia etc.).

Fraude nº 4 — Adulteração dos programas originais das urnas eletrônicas:

4.1. Como ocorre esta fraude: os programas originais de uma certa quantidade de urnas podem ser fraudados de forma que desviem os votos, atingindo uma quantidade determinada de seções eleitorais. A fraude seria feita pela introdução de um programa que desvie votos, por vários métodos: regravação da BIOS com programa fraudado, inicialização por memória externa ou disquete fraudados etc.

4.2. Quem pode fazer esta fraude: qualquer pessoa de dentro da Justiça Eleitoral ou de uma empresa que lhe preste serviços, que tenha acesso a um grupo de urnas eletrônicas (as quais, aliás, passam vários anos armazenadas em depósitos em vários lugares do Brasil), mediante conhecimentos médios de informática e disponibilidade de algum tempo para conhecer o sistema.

As observações a seguir valem para ambos os casos acima (3 e 4):

3+4.3. Como ocultar estas fraudes: o próprio programa fraudulento pode ocultar pistas, mediante fraude na verificação da integridade dos programas da urna e apagamento dos arquivos de registro de utilização da urna (logs). Eventuais lacres físicos rompidos podem ser facilmente substituídos, pois existe grande quantidade disponível. Fraudar é bem mais fácil que descobrir a fraude.

3+4.4. Facilitadores desta fraude: as urnas brasileiras não permitem auditoria da contagem de votos (recontagem). Desta forma, as urnas dependem unicamente da confiabilidade de seus programas de computador. Problemas: 1 — os programas das urnas eletrônicas jamais foram exibidos de forma integral para os partidos políticos; 2 — a parte do sistema das urnas que é exibida é composta de mais de 50 mil programas, que deverão ser analisados em tempo exíguo, utilizando os computadores do próprio fiscalizado (Justiça Eleitoral), que podem ser viciados; 3 — seria necessário garantir que os programas fiscalizados são os mesmos que serão instalados em mais de 400 mil urnas espalhadas por todo o Brasil — e isso não ocorre na prática, por três motivos: a) carência de fiscais, b) falta de treinamento dos fiscais, c) a verificação da assinatura digital é feita pela própria urna que é fiscalizada, que pode ser viciada.

3+ 4.5. Como evitar estas fraudes:

a — Auditoria dos programas originais das urnas eletrônicas: para conferir se o programa gerado pelo TSE não contém vícios. Todos os programas da urna devem ser públicos, para que seja possível aos fiscais verificar se não contêm algum comando desonesto.
Problemas: 1 — são mais de 50 mil programas para serem analisados em um prazo exíguo; 2 — o TSE *jamais* permitiu acesso a todos os programas das urnas eletrônicas, ou seja, *jamais* houve uma verdadeira auditoria independente das urnas eletrônicas;

b — Conferência da autenticidade dos programas de cada uma das urnas eletrônicas: para verificar se o programa do TSE, que foi auditado no item anterior, é idêntico ao que é instalado em cada uma das urnas eletrônicas.

Problemas: 1 — Se a providência anterior (a — auditoria dos programas originais das urnas eletrônicas) não for realizada adequadamente, de nada adiantará conferir se as cópias são idênticas ao original, pois a fraude pode estar embutida no programa original (caso da fraude nº 3), 2 — na prática (por incrível que pareça), os programas continuam sendo modificados pelo TSE depois da auditoria, tornando-a inócua; 3 — a assinatura eletrônica não é adequada para demonstrar que o programa não foi alterado (conforme conclusão deRonald Rivest, criador da assinatura eletrônica); 4 — é humana e tecnicamente impossível aos fiscais conferir a carga de quase 400 mil urnas em todo o Brasil (falta pessoal e treinamento).

c — Mecanismo de impressão paralela do voto: para suprir eventuais falhas das medidas acima ( a e b), o Fórum do Voto Eletrônico (secundado por diversos estudos internacionais específicos sobre votação eletrônica) propõe que o voto seja impresso pela própria urna e conferido visualmente pelo eleitor; após confirmação, seria depositado — sem contato físico — em uma urna de saco plástico. Problema: tal medida chegou a ser transformada em lei em 2002, mas nunca chegou a ser implantada oficialmente porque o TSE conseguiu usar de seu poderoso "lobby" para revogá-la no ano seguinte, antes de entrar em vigor em 2004 (foi feito apenas um teste nas eleições de 2002, que foi convenientemente "sabotado" pelo TSE para gerar a idéia de que não deu certo).

3+ 4.6. Exemplo destas fraudes: um teste simulado feito clandestinamente no Paraguai, com urnas brasileiras cedidas pelo TSE ( gravado em vídeo ), demonstra como é possível adulterar os programas oficiais da Justiça Eleitoral brasileira para que, digitando o número de um determinado candidato, o voto seja gravado (=apurado) pela urna em nome de outro candidato.
Contudo... no Brasil, o TSE vem sistematicamente se recusando a fazer um teste de penetração, segundo normas internacionais, para verificar a possível existência de fraudes no programa das urnas (neste ano, uma petição de abril nunca foi julgada pelo TSE, e provavelmente terá o mesmo destino dos anos anteriores: só será "vista" depois da eleição e perderá o objeto).

C — Fraudes na totalização

Totalização é a soma das apurações de cada uma das urnas, feita nos computadores de grande porte, na sede dos Tribunais Regionais Eleitorais. (Não confundir apuração com a totalização. Apuração é a soma dos votos de uma urna eletrônica, que é calculada pela própria urna e materializada no boletim de urna e gravada em disquete.)

Fraude nº 5 — Adulteração nos programas de totalização

5.1. Como ocorre esta fraude: o próprio programa (original ou fraudado) de totalização da Justiça Eleitoral pode alterar as somas das apurações, desviando votos para determinados candidatos; ou o banco de dados em que são armazenados os votos de todas as seções pode ser diretamente alterado.
5.2. Quem pode fazer esta fraude: servidores da Justiça Eleitoral, empregados de empresas terceirizadas ou terceiros invasores (por acesso direto ou utilizando vírus ou cavalos-de-tróia), por intermédio da rede do TSE. As urnas eletrônicas (que fazem a apuração) não estão em rede, mas os computadores da totalização são acessíveis em rede, potencializando o risco de ataques.
5.3. Como evitar esta fraude: os fiscais. É possível detectar uma fraude na totalização pela simples comparação com as somas dos comprovantes impressos das apurações de cada urna (boletins de urna) — a chamada "totalização paralela".

Problemas: 1 — Existem restrições à colheita dos boletins de urna nas próprias seções eleitorais, no momento em que são geradas (ver item 1.3), 2 — os partidos políticos, crédulos na impossibilidade de fraudes, se descuidam em exigir os boletins de urna em cada seção para uma totalização paralela, 3 — a imprensa, como já obtém os resultados oficiais com facilidade nos telões dos TREs, não se interessa mais em manter dispendiosos esquemas de totalização paralela.

5.4. Exemplos desta fraude: Rio de Janeiro, 2002 — alguns candidatos a deputado acordaram com menos votos do que tinham quando foram dormir na noite anterior — Jornal do Brasil, 11/06/2006;

Brasil, 2002 — em certo momento da totalização do primeiro turno da última eleição presidencial, o candidato Lula surgiu no telão do TRE/RJ com 41 mil votos negativos . Como os programas de totalização somente SOMAM votos, é no mínimo estranho que um candidato possa ter votos negativos, a não ser que exista algum comando no programa destinado a subtrair votos de um candidato. A Justiça Eleitoral nega o fato, testemunhado por todos os jornalistas então presentes. Não custa lembrar que Lula não ganhou a eleição de 2002 no primeiro turno por uma pequena margem de votos.

Revista Consultor Jurídico, 10 de setembro de 2006

sexta-feira, setembro 8

Nota de esclarecimento da Microbase


Em 31 de agosto, a Microbase Tecnologia, Serviços e Comércio Ltda. , empresa responsável pelo fornecimento do sistema operacional VirtuOS, utilizado nas urnas eletrônicas brasileiras divulgou a seguinte nota de esclarecimento:

CONSIDERANDO:

1. Sermos fornecedores do Sistema VirtuOS, sistema operacional que equipa grande parte das Urnas Eletrônicas utilizadas para a realização das Eleições Oficiais no Brasil;

2. A convocação que recebemos para, mais uma vez, comparecermos à Cerimônia de Assinatura Digital e de Lacração dos Sistemas para as Eleições Oficiais, desta vez para as de 2006;

3. O que é amplamente divulgado, comentado e publicado sobre o nosso reiterado não comparecimento a este evento nos últimos anos;

4. Que tem sido reiterado o nosso posicionamento oficial e por escrito, nos colocando a inteira disposição do TSE para acertarmos os detalhes e implicações da abertura de nossos Programas-fonte no devido processo de auditoria, entretanto, não merecemos, de quem de direito, até a presente data, a necessária atenção e providências; e ainda

TENDO EM VISTA:

5. Que a legislação em vigor que exige a auditoria de todos os programas-fonte do Sistema de Eleições Eletrônicas nunca foi adequada e rigorosamente obedecida pelo TSE, de modo a dar a necessária e devida credibilidade ao processo de Assinatura Digital e de Lacração dos Sistemas para as Eleições Oficiais;

6. Que denúncias de fraudes eleitorais estão sendo comprovadas de modo irrefutável, denúncias que, de algum modo, podem vir a nos envolver como fornecedores de uma peça importante do “software” utilizado nas Urnas Eletrônicas;

7. Que o descompromisso do TSE na condução de certos aspectos importantes que envolvem as Eleições Eletrônicas resultou, inclusive, em nossa denunciação à lide, numa ação judicial milionária de ressarcimento pela eventual apropriação indébita de “propriedade intelectual” do Sistema de Votação Eletrônica, do qual participamos apenas como fornecedores do Sistema Operacional e como mão de obra subcontratada para a prestação de serviços sob encomenda,

8. Que é de absoluto conhecimento geral que o Sistema de Eleições Eletrônicas é, como sempre foi, inteiramente concebido e definido pelo TSE, e pelo qual ele deveria se responsabilizar integralmente, tanto na esfera civil quanto na criminal, visto que, a cada dois anos, ele os encomenda sob sua rígida especificação aos licitantes vencedores dos Editais Licitatórios; e de que, finalmente

9. Apesar de ter amplo conhecimento desta ação, e mesmo tendo sido solicitado a fazê-lo, o TSE não interveio judicialmente, como poderia e deveria tê-lo feito para que se estabelecesse a verdade, deixando seus fornecedor e sub-fornecedor abandonados à sua própria sorte;

DECIDIMOS ESCLARECER A OPINIÃO PÚBLICA, DE UMA VEZ POR TODAS, QUE:

a) Somos a favor de que todo o software utilizado nas Urnas Eletrônicas das Eleições Oficiais do Brasil seja alvo da devida auditoria, realizada por uma equipe capacitada, de entidade privada, independente e insuspeita, especialmente contratada pelo Poder Público para tão importante tarefa, não durante um período de cinco dias úteis, o que a inviabiliza totalmente, mas durante meses de trabalho analítico, profundo e criterioso, como assim o demandam a transparência e o espírito democrático que deveriam nortear este processo;

b) Entendemos que os custos envolvidos nesta tarefa de auditoria serão absolutamente desprezíveis, não só diante dos custos totais para a realização de uma única Eleição a cada dois anos, mas principalmente, diante de sua importância para a absoluta garantia da democracia em nosso país;

c) Protestamos contra o fato de que, pelo menos o nosso Sistema Operacional VirtuOS não esteja sendo auditado no nível dos Programas-fonte pois, dado que qualquer tentativa de fraude intentada contra as Eleições Oficiais poderia, sim, ser perpetrada neste nível do “software”, tenhamos que correr o risco agora de nos envolvermos, mesmo que injusta e indevidamente, em um escândalo de fraudes, o que nos seria altamente prejudicial;

d) Protestamos, ainda, que o TSE não assuma publicamente e de forma irrefutável e definitiva, na esfera civil e judicial, que é integral, legítimo e o único proprietário intelectual do Sistema de Votação Eletrônica Brasileiro evitando, deste modo, que ações “caça níqueis” sejam acolhidas pelo Poder Judiciário e impedindo que seus fornecedores e sub-fornecedores sejam prejudicados por sua inação.

e) Que dentro do mais alto espírito democrático, mas sem perder de vista os nossos interesses empresariais, é claro, há anos estamos dando ciência desta posição ao TSE, nos oferecendo para encontrar um ponto de consenso que viabilize a condição necessária e suficiente para que seja executada uma auditoria em nosso sistema, como inequivocamente comprovam os documentos que possuímos.

Finalizando, lamentamos profundamente que um assunto desta responsabilidade e magnitude venha sendo tratado com o descaso reiterado que verificamos e, principalmente, que a opinião pública brasileira esteja sendo iludida, sendo levada ao erro de julgar que as Eleições Oficiais brasileiras esteja a salvo de fraudes o que, evidentemente, não resiste a uma análise técnica minimamente criteriosa e séria.

São Paulo, 31 de agosto de 2006
Frederico Gregorio Octaviano du Pin Galvão Neto
Sócio-Gerente Microbase Tecnologia, Serviços e Comércio Ltda.